Leonel Eneias Tinga é um criativo, designer gráfico multidisciplinar formado em Multimédia pelo IPCI/ISCIM. Com mais de 13 anos de experiência, tendo iniciado na Golo e seguido posteriormente para a Zwela e recentemnte à Touch. Trabalhou para alguns dos maiores anunciantes nacionais, como a Vodacom, Mcel, CDM, BancABC, MPDC e em comunicação corporativa/interna para a CLN/Nacala Logistics.
Primeiro,
quero agradecer por aceitar o convite para esta conversa.
Nada por isso, disponha sempre
Quem é
Leonel Eneias Tinga, no contexto design gráfico em Moçambique?
Sou um designer com orgulho e privilégio de fazer parte
de uma geração que faz a transição ou se preferir – a ponte entre a primeira
geração de designers moçambicanos e a nova geração com cada vez mais recursos
tecnológicos.
Como e
quando ganhou interesse em design gráfico?
Gosto de pensar no Design dessa forma romântica, mas na
prática o Design não é mais do que uma ferramenta de comunicação visual pela
qual eu me apaixonei como um marinheiro e seu barco ou o jogador e a bola que
em certa medida de alguma forma se tornam um só, claro, para atingir certos
objectivos.
Nasci designer, só não sabia que existia esse termo, mas
já vim ao mundo cheio de vontade de criar, para a minha sorte, não tive de
procurar conhecer qual era o meu dom ou talento, isso já estava no ADN, já
tinha o minset de criar, retratar a
realidade ou o imaginário. Na infância, desde os primeiros anos de vida,
desenhava com os dedos na areia desde que me lembro.
Conta-nos
o seu trajecto até chegar a primeira agência que trabalhou, a golo, suponho?
Na verdade não houve um grande trajecto, saí da formação
directo para a agência, para um estágio profissional obrigatório do curso de
Multimédia. Quis o destino que fosse a Golo, porque curiosamente a Golo não foi
a primeira empresa para onde fui, aconteceu que na primeira, eu e alguns
colegas com que lá fui não tivemos a oportunidade de praticar o que aprendemos
na carteira. Então o departamento ou o responsável pela área de estágios do
instituto conseguiu mais tarde 2 vagas para a Golo e, seleccionou os 2 melhores
estudantes para lá.
Como foi
recrutado para trabalhar de forma permanente para Golo e, qual foi sua reacção?
Lá fomos eu e um colega, mas eu fiquei voluntariamente
para além dos 3 meses obrigatórios porque queria aprender mais, sabia que havia
muito que aprender ''no terreno'' e conhecendo a grandeza e fama da agência não
vi melhor local para isso, até porque conhecia pouco da cidade de Maputo e
muito menos ainda sobre as agências ou possíveis empresas disponíveis. Quando
fiz 1 ano, o responsável do Dpto. de RH veio ter comigo e os colegas para
anunciar publicamente que eu passava a efectivo se concordasse, lembro-me que toda
agente ficou feliz porque seria uma pena eu ter de sair sendo que já dava um
suporte considerável à equipa, a agência ofereceu-me um contrato por tempo
indeterminado, foi um momento muito feliz, de realização e esperança porque se
alongava o meu tempo de aprendizado e prática ao lado dos melhores.
Acredito
que sua habilidade e dedicação contribuíram bastante para o reconhecimento. Como
veio a ascender para posição de director de arte?
Lembro que quando o Dr. Nadim ligou-me a oferecer o
estágio já dizia que era para sermos Directores de Arte e nós não sabíamos o
que era isso. Esta designação faz confusão a quem não sabe o que é, por causa
do termo "director" que na verdade não se refere a um cargo de
direcção ou chefia como pode parecer.
Esta designação tem mais sentido em inglês que é onde
penso eu ter sua origem e, quer dizer - o indivíduo que trabalha a arte
gráfica. O dirigir aqui tem o sentido de fazer a arrumação ou arranjo gráfico,
organização de layouts, etc.
A ascensão que houve foi de Assistente para Criativo e
Arte finalista em simultâneo. E mais uma vez não são cargos, são apenas
funções, entretanto como novato devia iniciar como assistente.
A GOLO dividia a Criação em 2, uma parte que é o Dpto.
Criativo propriamente dito e o Dpto. De Finalização. Algumas agências não têm
essa estrutura, o designer simplesmente exerce ambos papéis. Como estagiário e
depois como assistente dava suporte a ambos Dptos.
Inicialmente colocado no Dpto. de Finalização, como o nome
já diz, preparava as artes finais com o trabalho vindo da Criação. Fazia as
adaptações para os diversos medias. No início não fazia nenhum retoque ou
ajuste à arte mas à medida que os colegas foram ganhando confiança e ficando
confortáveis com a minha execução foram passando esse trabalho para mim até que
chegamos ao ponto de eu passar também a criar algumas artes de raiz, começando
com trabalhos de pequeno vulto até chegar a peças de máxima importância como
outdoors e anúncios de imprensa dos clientes mais importantes.
Segundo
informações, o seu primeiro trabalho de máximo importância foi um que quase
todos moçambicanos tiverem contacto com ele: o rebrading da Mcel (actual Tmcel).
Qual foi o processo criativo por detrás do mesmo?
Na verdade esse foi o segundo do género, o primeiro foi
também um rebranding, mas da concorrência da Mcel – a Vodacom. Eu e os meus
colegas da Finalização fomos os responsáveis por trabalhar a mudança da imagem
de Azul para Vermelho e todas as peças eram aprovadas pela Vodafone em Londres.
Foi um dos trabalhos mais interessantes e mais importantes da minha carreira,
aprendi muito sobre Branding, Posicionamento da Marca, etc.
E nesse processo fui eu encarregue de recriar as recargas
com as ideias visuais gerais vindas dos criativos, e ao longo dos anos fomos
optimizando o desenho até ao aspecto que têm actualmente, mas claro, já
reactualizadas porque o processo é progressivo.
Então com essa experiência adquirida, quando a Vodacom
passou para uma outra agência, ganhámos a conta da Mcel e, tendo ela também de
fazer um rebranding foi novamente a mim que esse trabalho das recargas foi
designado, já que tinha bastante experiência com isso.
Como se pode perceber não foi bem um processo de criativo
mas um processo progressivo – de optimização progressiva. Até porque não
existia nada igual para servir de referência. Mas a ideia geral era termos
recargas com as menores dimensões possíveis sem deixar de passar a mensagem da
marca.
Tem algum
trabalho que tanto estima até hoje?
São vários. Não tenho um preferido. Os trabalhos ou peças que mais estimo, penso que não são daqueles "wow" que atraem mais os olhos do público.
São trabalhos com mais atenção aos detalhes como os cartazes,
anúncios e panfletos promocionais. É um engraçado que quando mais novo, antes
de sequer imaginar que poderia um dia trabalhar com design, já apreciava e até
guardava alguns folhetos e encartes das operadoras não só pelo interesse nos
produtos mas muito mais por achar o design interessante.
E também peças como os anúncios do Arroz Royal Aroma. O outdoor do carro da campanha Toyota é Toyota, que não é criação minha, como pode parecer, mas foi meu trabalho de execução de todos os detalhes. E sem deixar a criação de Identidades de lado que é uma das áreas que mais gosto, o logo do Manufacturing Way da SABMiller feito para a CDM.
Podia
explicar de forma breve o processo de concepção da obra de arroz que considero
muito a frente, digo, a técnica.
Este foi um trabalho interessante. Acho que a regra
KISS(Keep It Simple and Stupid) mais uma vez funcionou aqui. Este foi um dos
poucos Eureka que me vêm à memória. Mas a técnica em si já não me era tão
novidade. Já tinha trabalhado, não criado mas finalizado com técnica similar na
Golo. Este foi já na Zwela quando acabávamos de conquistar a Olam como cliente.
E construí grão-a-grão, sem descartar as sombras.
A diferença é que na campanha dos cigarros as beatas
foram apanhadas, recolhidas na cidade, espalhadas e organizadas no chão e
fotografadas com direito a remendos e arranjos para o toque final.
Nunca
tinha visto a campanha dos cigarros.
(Risos) Entendo, é pena mesmo que muitas campanhas não
têm o tempo de vida que seria o ideal para veiculação. E o trabalho que muitas
vezes até é muito eficiente em passar a mensagem é pouco ou quase nada visto.
Há
campanhas com conceitos menos atractivos e conseguem ter um alcance maior.
Pois, este é outro desafio que temos, nós os designers
emergentes, não sermos apenas executores, mas sermos mais marketeers, nesta era
não podemos dar-nos ao luxo de sermos "gráficos" ou maquetizadores,
não podemos ser meros "paus mandados", há necessidade de sermos mais
proactivos e educativos para com o nosso mercado moçambicano.
Entende-se perfeitamente que algumas campanhas não durem
muito por low budget mas se não evoluirmos esta será a regra e não a excepção
O Design com
o advento do social media tendem a ser mais efémeras. Layouts bem executados
que servem somente para um dia.
Sim, essa é a tendência, e estamos a levar do print ao
digital. E o meu ponto é, o rumo disto está nas mãos das agências e dos
Freelancers.
Pois é bem sabido que do lado do cliente muitas vezes não
há e, dependendo da estrutura da empresa nem deve necessariamente haver, quem
entenda de estratégia de marketing e de design, há apenas executivos vendendo
produtos e serviços e esperando resultados.
Qual acha
que é o desafio que os designers emergentes terão de enfrentar em comparação
com a época em que começou?
Na época em que iniciei não só aprendi muito, mas também
ensinei, os meus colegas eram da escola gráfica antiga, então eu ajudei na
transição para o uso das ferramentas da Adobe que eu acabava de aprender na
escola.
Penso que um dos maiores desafios é evoluírem rapidamente
acompanhando a velocidade mundial sem sacrificar a qualidade na
concepção/criação de conceitos criativos.
Últimas
considerações, e dizer também que gostaria de convidar-lhe para uma conversa em
áudio.
Estou sempre disponível para passar a minha experiência,
apesar de muitas vezes a correria dificultar. Espero que da próxima em áudio ou
presencialmente.